quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Eles nunca serão jornalistas

A discussão sobre a obrigatoriedade do diploma para a prática do bom jornalismo é patética. Por muitas razões. Primeiro, porque começa onde quase tudo começa neste mundo estranho em que vivemos: no dinheiro. Empresas de comunicação querem se livrar de uma categoria organizada e cujas regras estão regulamentadas. Isso vai facilitar muito a tarefa de jornais, revistas e emissoras de TV, especialmente estes veículos tradicionais, na hora de definir a remuneração da turma da redação. Não tenho nenhuma dúvida de que irão oferecer salários piores do que os atuais. Se com diploma a grana é curta, sem ele...

Mas a questão do dinheiro, ainda que importante, não chega a ser a principal. Pelo menos para mim. É inevitável que um jornalista não formado, em sua grande maioria, irá oferecer um trabalho precário ao leitor, ao telespectador. Por uma razão muito simples: quem não tem diploma, quem não passou pela formação intelectual que todos os profissionais recebem quando cursam – e concluem – um curso universitário, não tem condições de compreender o mundo a partir da ótica do jornalista.

Os defensores da desregulamentação da profissão, os defensores do fim do diploma são, em primeiro lugar, defensores da preguiça e da malandragem. Não tiveram a fibra nem a garra do estudante de Jornalismo para chegar lá. Eles querem o atalho, querem o caminho mais curto, querem a vida mansa dos que furam a fila para levar vantagem sobre os demais. Querem chegar primeiro, mesmo tendo partido muito depois.

Não pensem que os que são contra o diploma querem fazer matérias investigativas, querem denunciar as agruras do mundo ou expor sua vida de facilidades sob qualquer risco. Não pensem que eles sonham em ser pesquisadores da área da Comunicação ou queiram participar de discussões, debates, congressos que contribuam para o crescimento da pesquisa em Comunicação. Que nada. Eles querem apenas escrever ou emitir suas nobres opiniões na grande imprensa. Desde que tudo seja feito em uma sala equipada com poltronas de couro e ar-condicionado com controle remoto. Pra não cansar.

Concordo com o jornalista formado David Coimbra, de Zero Hora, parceiro de muito trabalho e boas festas, quando diz que não quer ler matérias no jornal escrita por leitores. Eu também não quero! Não quero ouvir ouvintes na rádio dizendo o que está acontecendo na BR-116. Eu não quero assistir a um telejornal que coloca o telespectador para fazer notícia. Eu quero ser informado por quem é do ramo, por jornalistas.

Eu adoraria ver um desses falsos jornalistas cobrindo – in loco, e não do quarto do hotel – o conflito entre a Rússia e a Geórgia, por exemplo. Adoraria ver um deles em meio a uma batalha campal entre a Brigada Militar e integrantes do MST, como tantas vezes os jornalistas formados já fizeram e, por isso, se arriscaram para levar a melhor informação à sociedade. Adoraria ver os defensores da desregulamentação da profissão de jornalista subir o Complexo do Alemão, no Rio, para entrevistar traficantes ou se enfiar selva adentro para uma conversa amistosa com integrantes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

Esses meus desejos, no entanto, não passam de devaneios. Jamais verei um furador de fila fazendo o velho e bom jornalismo, o jornalismo de verdade. Sim, porque jornalismo de verdade só pode ser feito por jornalista de verdade. O resto é história mal contada por quem não aprendeu a ser – e nunca será – um jornalista.

* Foto de Marcelo Collar, estudante da Unisinos, que se prepara para ser, de fato, um jornalista.