segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Máquina de escrever. Máquina do tempo

Levei um susto ao abrir a página 48 de Zero Hora na sexta-feira passada. Era uma matéria policial. Sempre leio esse noticiário, até porque durante muito tempo fui repórter de Polícia daquele jornal. A minha surpresa, no entanto, não se deu pelo texto ou pelo fato noticiado em si. Mas a foto, com crédito de Daniel Marenco. A foto é de uma máquina de escrever sendo utilizada pelo escrivão de polícia da delegacia de General Câmara. Uma máquina de escrever! Santo Cristo, há quanto tempo eu não via uma máquina de escrever!

Achei que os novos tempos, chamados de pós-moderno por muitos teóricos ou de modernidade líquida por Zygmunt Bauman, tivessem atropelado tudo de roldão. Mas não. O liquidificador da globalização, que mistura hábitos e costumes e desmancha tradições e culturas, parece que se esqueceu da máquina de escrever por algum motivo. Não sei se ainda existem outros exemplares como este da delegacia de General Câmara, mas não devem haver muitos outros por aí. Ainda mais assim, funcionando. O meu espanto se dá, em grande parte, porque nunca usei uma máquina de escrever. Digo, de maneira profissional. Claro, quando era criança, brincava com o equipamento do meu pai.

Sabem qual era a utilidade que eu dava para a máquina de escrever Olivetti do meu pai? Deus, lembro como se fosse hoje! Eu escrevia a escalação dos times de futebol da época.
Então, recortava cuidadosamente os nomes e os colava nos meus botões. Sim, pode não parecer, mas eu era um exímio jogador de botão. Nos dias pós-modernos chamam este esporte de “Futebol de Mesa”. Até hoje tenho os meus times de botão, que não são mais exatamente meus, mas do Filipe, que já começa a virar craque.

Mas eu falava de máquinas de escrever. Na adolescência, talvez, tenha utilizado tal ferramenta para algum trabalho escolar, não lembro. Quando comecei a estudar jornalismo, lá por 1990, na Unisinos, já tinha computador. Um ano depois, entrei para a redação do NH, em Novo Hamburgo/RS, claro. O jornal, que tem sido um pioneiro em muitos aspectos do jornalismo gaúcho, foi também o primeiro a ter a redação informatizada. Ou seja, eu já comecei minha vida profissional com teclado e tela para escrever.

Fico imaginando como seria fazer um jornal diário com máquina de escrever. Jornalistas mais antigos que eu dizem que eram bons aqueles tempos em que no final de cada dia as latas de lixo das redações ficavam abarrotadas de papel, tantas eram as vezes que os profissionais erravam o texto e tinham de começar tudo outra vez em uma lauda novinha. Eu não resistiria. Para concluir este artigo, errei, apaguei tudo e comecei de novo umas 50 vezes. Por excesso de gasto com papel, eu não resistiria em nenhuma redação daqueles bons tempos.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Juro que eu me esforço

O verão é uma estação estranha para mim. Não que eu não goste de sol, mar, piscina, bebida gelada, surfe e pernas para o ar. Adoro. Aliás, até já morei na Praia do Rosa. Só que aqui, no extremo sul do país, o verão é uma época pitoresca e, em muitos casos, grotesca até. Estou me referindo ao clima que toma conta das cidades e principalmente das pessoas.

Porto Alegre, no verão, é uma capital civilizada, apesar do calor à la Senegal. Diminui o fluxo de carros, as filas são menores, há lugares sobrando nos restaurantes, bares e supermercados, as pessoas andam sem pressa e a chance de ser atropelado em algum corredor de shopping é quase zero. Por isso, a cidade melhora. É até paradoxal perceber que a cidade fica melhor quando grande parte das pessoas não está nela. Adoro Porto Alegre com pouca gente. Como é bom Porto Alegre quase sem habitantes. Sim, porque esses habitantes não estão aqui no verão. Eles vão para o litoral, especialmente. E, assim, transferem o inferno demográfico da capital para as praias.

Eu, que não entro no mar do Rio Grande do Sul há pelo menos duas décadas, sou daqueles poucos que na segunda-feira dizem, quase que com vergonha e constrangimento, que não fui à praia no final de semana. Quando digo isso, sou olhado com desconfiança. É que nesta época do ano, em Porto Alegre, é feio dizer que não fomos à praia no "findi". O chique, o bacana, é chegar na segunda-feira com cara de quem foi pra praia. Rosto avermelhado e corpo estressado com o tumulto, a ventania, a sujeira e os engarrafamentos. Chega a ser grotesco esta modinha provinciana de que temos de ir ao litoral nos finais de semana.

E mais grotesco ainda são as colunas sociais dos jornais gaúchos. Quando eu acho que vou me livrar dessas páginas no verão, pronto, lá estão elas contando onde anda aquela gente toda. Cristo, é de um provincianismo sem precedentes. Morro de rir com as legendas das fotos: “fulana de tal aproveita o sol em Bikíni, Punta del Este”. “Fulano de tal recebe os amigos em sua linda cobertura, em Punta”. “Fulaninha e fulaninho, lindos como sempre, curtem o calor em Atlântida”. Eu sei que tem muita gente que adora as páginas “sociais” dos jornais, até pela curiosidade de ver se alguém que a gente conhece aparece por ali. Compreendo. Mas eu, que entre outras coisas, me preocupo em ser um jornalista crítico do trabalho da mídia, quase não agüento. Eu me esforço, juro. Mas quase não agüento.

* Crônica publicada em http://www.gramadosite.com/ em 21/11/2007.