segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Sonhos antigos, novos desejos

Eu sei que vou cair no clichê, mas não tem como chegar a poucas horas do fim de um ano e não tentar fazer uma reflexão. Não posso reclamar de 2009. Não estou me referindo apenas ao âmbito material, que também é muito importante. Trabalhos, lutamos, corremos eternamente atrás da máquina para alcançar objetivos na vida. E alguns são, sim, objetivos materiais. Mas não é disso que quero falar. Falo que 2009 foi um ano de grandes conquistas subjetivas.

Termino 2009 com a sensação do dever cumprido tanto do ponto de vista pessoal quanto do profissional. Neste último, apesar de todos os avanços que tive neste ano, sempre podemos crescer mais, surpreender um pouco mais. No campo pessoal, o cara que chega à virada do ano é um cara mais experiente - pode parecer óbvio, mas nem sempre amadurecemos como deveríamos de um ano para outro -, mais sensato e muito, mas muito mais centrado na minha casa, na minha família. Meu grande desafio em 2010 é justamente equalizar esses dois grandes campos do meu cotidiano: a vida profissional com a familiar. E vice-versa.

Eu tenho por hábito enfrentar desafios com alguma desenvoltura. Acabo me saindo bem. Então, o que desejo para mim mesmo é serenidade, equilíbrio, alegria, força de vontade, saúde, trabalho e luta para buscar realizações subjetivas, outras tantas materiais, necessárias para o bom andamento da rotina. Quero consolidar conquistas, concretizar sonhos antigos, inventar novos desejos. Que vocês também consigam suas vitórias em 2010.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Como é bom falar de jornalismo

Eu gosto de milhares de coisas nessa vida. Gosto do mar, do sol, do verão, de pegar minhas ondas. Gosto do inverno, do frio, de ficar bebendo vinho em frente à lareira. Gosto de ficar em casa com a minha mulher, com meu filho e meus cachorros. Gosto de futebol, do Internacional e até de assistir Vasco e ABC de Natal. Gosto de trabalhar, de fazer o que faço. Gosto de dar aula, de ensinar. Gosto de ler, de aprender e de estudar. Gosto de tocar conversa fiada com os amigos, das risadas de mesa de bar.

Mas quase nada das coisas que gosto fariam sentido se não gostasse da minha profissão. Adoro ser jornalista e trabalhar com jornalismo. É o que faço todos os dias desde 1991.
Por isso, falar de jornalismo pra mim é falar do mundo vibrante das palavras, do texto, da vida cotidiana, do imaginário, do registro dos fatos que nos anos seguintes servirá, certamente, como registro histórico.

Nessa semana tive uma das experiências mais marcantes da minha trajetória de jornalista, que nasceu na redação do NH, em Novo Hamburgo, passou pelo jornal Zero Hora, por Brasília, pelo jornalismo online, dezenas de viagens pelo Brasil e no Exterior e chega, neste momento, ao ensino de futuros jornalistas na Unisinos e na PUCRS. Na noite do dia 10 de novembro, compartilhei um debate rico e leve com o jornalista, professor e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS, Juremir Machado da Silva, sobre um gênio do jornalismo mundial, Tom Wolfe.

Wolfe é o ilustre convidado do Fronteiras Braskem do Pensamento no dia 16 de novembro, na UFRGS. Por isso, fui convidado, junto com Juremir, para fazer uma espécie de apresentação do pensamento de Tom Wolfe a uma seleta plateia, muitos dos quais deverão estar na palestra do mestre do New Journalism. Minha participação neste evento se deveu, em grande medida, porque minha tese de doutorado na PUCRS é justamente sobre imaginário e ficção na reportagem, um mergulho no jornalismo literário, sob orientação cirúrgica do Juremir.

A criação do Novo Jornalismo mexeu com o jornalismo padrão que se fazia naqueles últimos anos da década de 50, começo dos 60. O jornalismo padrão, bege, segundo Tom Wolfe, cansava o leitor pela absoluta falta de criatividade, com textos sonolentos e óbvios. O jornalismo, na época, se preocupava em mostrar quem matou quem e onde. Mas quase nunca queria saber como e porquê o crime havia ocorrido. Esta era a senha para a produção de reportagens profundas, detalhistas. Esta era a senha para ir além, muito além do que os outros já tinham ido.

O Novo Jornalismo surgiu com um texto fortemente amparado em recursos da literatura, com descrições detalhadas das cenas, transcrição de diálogos, observação sobre o status do entrevistado (ou dos envolvidos com o assunto), como a roupa, o jeito, as expressões, o gesto, o cheiro e o ambiente em que os fatos ocorreram. A intenção era pegar o leitor pela mão e colocá-lo na cena do fato.

Com isso, o Novo Jornalismo conseguiu, com grande aceitação do público e uma boa dose de repúdio por parte dos romancistas, estabelecer um texto não-ficcional com a emoção típica dos romances. Grandes reportagens viraram livros geniais, como A Sangre Frio, de Truman Capote, Fogueira das Vaidades, de Tom Wolfe, Fama e Anonimato, de Gay Talese. Os romances de não-ficção mudaram completamente o jeito de fazer jornalismo.

Claro que no final das contas, o que vale é o texto. O que existe em jornalismo é texto ruim e texto bom. No Novo Jornalismo, isso fica latente. As virtudes e os defeitos saltam aos olhos do leitor. Por isso, quem se aventura no jornalismo literário precisa saber o que está fazendo. Não é um bicho de sete cabeças. Mas também não é um bicho de uma cabeça só.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O patrono da alegria

O patrono está feliz. Candidato ao cargo de patrono da 55ª Feira do Livro de Porto Alegre por cerca de uma década, o jornalista e escritor Carlos Urbim chegou lá este ano. Em um encontro restrito a amigos na noite de quarta-feira, 7, em um bar movimentado da Cidade Baixa, o guri daltônico de Santana do Livramento não escondeu o contentamento de ter sido eleito o personagem principal da maior festa cultural do Rio Grande do Sul.

Urbim é uma das pessoas mais pontuais que conheço. O encontro estava marcado para as 21h. Cheguei às 21h10min. Na frente do bar, o patrono. Em pé, de calça, camisa, blusão e tênis pretos e o inconfundível cabelo grisalho moldado levemente por gel, Urbim segurava um quase proibitivo cigarro na mão direita. Na esquerda, uma pequena sacola plástica com dois de seus últimos trabalhos de presente para mim (Zamprogna: a história da imigração italiana e a industrialização do Rio Grande do Sul, Via Norte, 2008) e para meu filho (Admissão ao Ginásio, Escritos, 2008). “Que bom te ver. Vamos entrar e fazer uma homenagem ao jornalismo rio-grandense”, disse, sorrindo, o autor de Saco de brinquedos, com a voz de trovão e entonação infanto-juvenil.

Membro desde o ano passado da Academia Rio-grandense de Letras, Carlos Urbim tem consciência de que sua eleição para patrono não deixa de ser uma espécie de oxigenação no restrito mundo das letras. “Eu escrevo livros infantis. Cheguei até aqui escrevendo para crianças. Isso é surpreendente”, observa, distribuindo com cuidado o molho de pimenta sobre o bolinho de bacalhau fumegante. A escolha de Urbim também representa a opção pela informalidade em meio ao universo conservador, formal e sisudo das academias de letras e das câmaras de livros. Urbim quer que a velha feira da Praça da Alfândega seja uma feira renovada por um patrono que representa a felicidade espontânea do público infantil.

Chegar a patrono da feira numa disputa com Airton Ortiz, Juremir Machado da Silva, Regina Zilberman e Luis Augusto Fischer deixaria qualquer um, de fato, orgulhoso. Mas Urbim não sente apenas orgulho. Ele tem gratidão. E muita. Por isso, quando tiver de fazer seu primeiro discurso na Praça da Alfândega, Urbim já avisou que a lista de agradecimentos será longa. “Vai ser uma lista telefônica. Não quero deixar ninguém de fora. Pretendo agradecer publicamente a todas as pessoas que trabalharam comigo nesses anos todos, inclusive muitos dos meus companheiros de redação. Sou escritor, mas sou jornalista. Eu me sinto um representante do jornalismo gaúcho neste momento”.

Antes do primeiro gole de uma gelada Pilsen uruguaia, erguemos o copo para o brinde. E Urbim soltou novamente o vozeirão. “Vou ser o patrono da alegria. Vou levar o sorriso à Praça da Alfândega”.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Às vezes cansa

Estou cansado dos discursos do Lula, do Jornal Nacional, dos programas esportivos do rádio gaúcho, dos comentaristas tradicionais. Cansei dos jornais que assino. Estou cansado das novas velhas notícias das editorias de política, dos escândalos do Congresso, da vida fácil dos senadores, da corrupção nacional.

Estou cansado da rotina da mídia nacional, do Dunga e de sua seleção. Cansei da CBF e de seus interesses malandros e obscuros. Estou cansado da narração do Paulo Brito, da RBSTV, e do malabarismo circense do Galvão Bueno. Estou cansado de ver tanta bobagem no noticiário esportivo.

Estou cansado da poluição ambiental, da camada de ozônio, do CO2. Cansei do oportunismo ecológico e da conversa fiada em favor do verde. Estou cansado da discussão banal e leviana sobre o pré-sal. Estou cansado do pré-sal e do discurso ideológico que vem de brinde. Estou cansado do atraso social, econômico, educacional da América Latina. Cansei do papo-furado do Hugo Chávez e do Evo Morales. Cansei do bolsa-família e do vale-refeição.

Estou cansado do cinema nacional e dos filmes da TV aberta. Cansei das opiniões das celebridades, que sempre têm algo inteligente a dizer. Estou cansado do mundo fútil que gravita em torno do narcisismo televisivo e cinematográfico.

Não tenho Orkut, mas já cansei do Orkut. Tenho twitter, mas não uso. Estou cansado do celular que faz foto, que filma, que toca FM e que, surpreendentemente, também serve para falar com alguém. Estou cansado do controle remoto.

Meu cansaço é cíclico. Não é permanente. É que nem sempre estou disposto, nem sempre estou a fim de tudo o que o mundo me oferece ou me obriga a aceitar. Hoje estou cansado. Não há motivo especial algum, nada grave. É que às vezes, cansa. Só isso. Eu canso. Às vezes.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Vale tudo

Cheguei a ficar emocionado com a notícia. Sério! A partir de agora, o povo brasileiro terá acesso à cultura. Anunciado com alarde pelo governo federal, o Vale-cultura promete colocar o pobre no cinema, no teatro, nos concertos, nas exposições de artes. O governo Lula vai bem. Encontrou na distribuição do vale o caminho das pedras. Depois do bolsa-família, a ideia é que os R$ 50,00 do VC sirvam como ferramenta de inclusão de trabalhadores de baixa renda no circuito cultural do país.

No lançamento do projeto, o presidente da República estava eufórico. Cheio de bom humor e largando as tradicionais piadinhas – foi o que li na edição online de O Globo em 23 de julho. Segundo a proposta, com este dinheiro o beneficiário poderá comprar ingressos para cinema, teatro, shows, livros, CDs (vale CD pirata?) e eventos culturais de toda ordem. Mas acho que ainda vai faltar grana para ver e ouvir Caetano Veloso, Maria Rita e outros nomes da MPB...

Sinto no ar um cheiro forte de aprovação da sociedade brasileira em relação à instituição do Vale-cultura – que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional, é bom que se diga – na rotina nacional. Ouço coisas do tipo “até que enfim pensaram na cultura”; “show de bola, o povo precisa de cultura”; “já estava na hora da inclusão cultural”. A verdade não existe, sabemos. A verdade é uma versão bem-sucedida sobre um fato. É um ponto de vista em relação a alguma coisa. É alguma coisa vista de um ponto de vista. Então, visto assim, por este ângulo, sim, devo concordar que a ideia é boa.

Eu disse ‘a ideia é boa’. A forma como esta ideia será colocada em prática é que são elas. Não concordo com o VC, assim como não concordo com o vale-transporte, o vale-refeição, o vale-alimentação, o vale-gás, o bolsa-família. A gente não quer só comida, seu presidente. A gente quer diversão e arte, sim, como dizem os Titãs. Mas queremos tudo isso com a dignidade do salário, presidente. O vale é indigno. Enquanto o brasileiro precisar de todos esses vales pra viver, presidente, o Brasil continuará sendo o país da esmola e do assistencialismo. Continuará sendo um país sem salário, um país do vale-tudo.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Vida de ministro

Uma grande curiosidade toma conta de mim neste momento. O que o nobre ministro Gilmar Mendes faz nas horas vagas? O que faz um homem tão culto, letrado, depois que tira o peso da toga dos ombros ao final de sua, imagino, árdua labuta diária? Será que Mendes faz um happy hour com os amigos ministros? Será que ele tem amigos? Será que toma um chopinho, come churrasquinho no espeto – daqueles vendidos em estacionamentos de muitos supermercados de Brasília? Será que ele assiste a alguma partida de futebol na TV? Será que ele curte uma novela? Será que ele gosta da Norminha em cena?

Gostaria de saber como é a rotina de um homem tão nobre e poderoso. Como ele se veste em um sábado pela manhã, sem os compromissos tão exaustivos de ministro do Supremo? Será que ele veste bermuda de sarja e camisa pólo? Bem, disso eu não tenho dúvida. Gente da estirpe de Mendes, nobres da corte, sempre vestem bermuda de sarja e camisa pólo. Assim eles se acham descontraídos e elegantes ao mesmo tempo. Ficam, digamos, brega-chiques. Será que o ministro que admira cozinheiros sabe cozinhar? Será que ele reúne amigos para uma paella preparada por ele mesmo? Nossa, imaginem ser servido pelo todo-poderoso do STF... Que luxo, diria um amigo meu.

Essas perguntas rondam a minha cabeça desde que Gilmar Mendes se tornou o grande porta-voz de toga para declarar que o diploma de jornalista não precisa mais ser exigido para o exercício da profissão. Ao justificar seu voto a favor da martelada sobre o diploma, Mendes fez comparações tão infantis que me recuso a ordená-las aqui. Mas algo me chama a atenção. Ao comparar a necessidade de diploma para o exercício do jornalismo com a atividade de um cozinheiro, fiquei preocupado com o ministro. Por alguns instantes, deixei de me preocupar sobre como seria a vida banal e ordinária de Mendes. Passei a me preocupar com sua saúde! Será que nosso ministro está bem?

Será que ele está conseguindo fazer coisas mundanas, como julgar o futuro da profissão dos outros? Será que ele está mental e fisicamente saudável para compreender o que representa um diploma na vida de um universitário? Na vida de um jornalista formado, qualificado, capacitado, habilitado? Temo que não. Gilmar Mendes não parece bem. Dizem que ele sequer anda lendo jornais. Dizem que há dias não assiste a nenhum telejornal. Mas tudo isso pode ser fofoca de jornalista, intriga contra o pobre do ministro. Neste emaranhado de dúvidas que me atordoam, uma certeza eu tenho: Mendes pode até ter deixado de ler jornais, mas continua lendo a Veja. Religiosamente.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

O tempo

Acordei cedo, pensando na falta de tempo. E me dei conta que marcamos a vida pelo tempo. O tempo primitivo, das cavernas. O tempo da pedra, do fogo. Das guerras sangrentas, das cidades muradas, das cruzadas. Um tempo que parecia não ter fim. O tempo em que os deuses eram muitos. Tempo da inquisição em nome de um único deus. Tempo de buscar um novo mundo, da opressão sob o manto da colonização de povos tropicais e nus. Tempo de escravidão.

Tempo do lampião, da energia elétrica, do trem, da indústria, do capital. Tempo de dominações armadas, da força bélica de algumas nações sobre outras – este tempo nunca passa. Tempo de duas grandes guerras. De pensar uma sociedade socialista, comunista. Tempo do medo permanente de uma guerra fria. Tempo de conhecer o espaço, o universo, a galáxia. Tempo de controlar o incontrolável, a via láctea.

Tempo de crescimento econômico para alguns. De estagnação para outros. Tempo de espalhar ideologias, apagar outras. De tempos em tempos aparece alguém que logo é assassinado. O tempo se encarrega de carregar o morto ao patamar dos mitos. Tempo de trabalho pesado, de jornadas estafantes em busca da sobrevivência rural e urbana. Tempo de perder emprego e de buscar o ganho informal. Tempo de fartura. Tempo de fome. Tempo de crise do social. Tempo de crise do capital.

A mídia conta o tempo que a História só conta muito tempo depois. Tempo da imprensa contar tudo – quando a ela interessa – e de esconder o que pode – quando a ela também interessa. Tempo de literatura, de leitura. O jornal faz o tempo e avisa como será o tempo amanhã. Tempo de tecnologia. Tempo das ondas do rádio. É tempo de televisão.

O fascínio da tecnologia deixa o tempo para trás. Tudo é muito apressado para quem acha que controla o tempo. Tudo é preguiçoso para quem não percebe o que se passa ao seu redor. O tempo de hoje é apenas mais um tempo. Um tempo veloz e repleto de informações. O tempo virtual que nos move pouco se importa sobre o que, de fato, nos comove. O tempo segue firme o seu destino de sempre. Até que nos leve de volta ao tempo primitivo, das cavernas. O tempo da pedra, do fogo. Das guerras sangrentas, das cidades muradas, das cruzadas. Ao tempo que parece não ter fim.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Quem gosta de teoria?

Pessoas não gostam de teoria. Mais que isso. Pessoas têm ojeriza a tudo o que possa gravitar em torno da palavra teoria. O que importa é a prática. Sim, o mundo lá fora não tem nada de teoria. O mundo real é prático. O mercado de trabalho é prático. A vida é prática. Não há nada de teórico em acordar às 6h e sair às pressas para o trabalho, dar um duro danado o dia todo e voltar cansado pra casa à noite. A luta cotidiana por uma vida decente consome as pessoas. E as força, de certo modo, a pensarem pouco mais que o necessário.

Não me refiro ao pensamento regular, comum, sobre os fatos e as coisas da rotina urbana. A ditadura da vida prática restringe o pensamento denso, profundo sobre esse mesmo cotidiano. O prático inibe a reflexão de tal forma que tudo o que percebemos ao nosso redor acaba parecendo banal, simples. Quem não reflete acredita que tudo é assim porque é.

Se refletirmos um pouco, vamos notar que há teóricos para tudo: internet, literatura, política, comunicação, economia, televisão, fotojornalismo, teatro, cinema, futebol, medicina, urbanismo, radiojornalismo, trânsito, agricultura, cultura, drogas, sexo e rock and roll. Atrás de tudo o que possa nos parecer apenas prático existe mundos repletos de teoria.

A internet, por exemplo. A partir do www, o mundo mudou, sabemos. Mudou o jeito de buscar informações, de ler, de ouvir música, de guardar fotografias, de conversar, assistir a um filme, sintonizar uma rádio, de namorar, de se relacionar com as pessoas. E tudo isso em velocidades inimagináveis há poucos anos. Neste mundo veloz, de trocas rápidas de informação e afeto, mal conseguimos nos atualizar.

Se normalmente não nos apegávamos ao teórico, com a pressa imposta pela web ficou ainda mais difícil de pensar com profundidade. No entanto, é fundamental parar e refletir sobre os mundos que nos cercam. Há alguns dias li um artigo de André Lemos sobre cibercultura. Lá pelas tantas, o autor instiga o leitor a pensar se a internet é uma mídia. Interrompa agora a leitura deste texto por alguns minutos. Reflita sobre isso antes de prosseguir. A internet é uma mídia?

Não, a internet, diz Lemos, não é uma mídia de massa como as que conhecemos há anos. O autor explica que a diferença entre a internet e as mídias tradicionais reside na não vinculação entre o instrumento (equipamento) e a prática. Diz ele: “Quando falo que estou lendo um livro, assistindo TV ou ouvindo rádio, todos sabem o que estou fazendo. Mas quando digo que estou na internet, posso estar fazendo todas essas coisas ao mesmo tempo, além de enviar e-mail, escrever em blogs ou conversar em um chat”. Quando estamos na internet, ninguém sabe exatamente o que estamos fazendo.

Simples, não? Assim fica claro que internet, de fato, não é uma mídia de massa. O engraçado de tudo isso é que a solução ao questionamento proposto por Lemos não vem essencialmente da prática, do uso da internet. Para decepção geral dos práticos de plantão, esta resposta vem da teoria, da reflexão sobre a utilização do www.

segunda-feira, 23 de março de 2009

O Brasil não é um país democrático

Os políticos adoram dizer que o Brasil é um país democrático. Para eles, o Brasil é uma maravilha de democracia. Volta e meia, um desses engravatados elogia o “amadurecimento” do processo democrático do país. Lindo isso. Chego a ficar arrepiado quando ouço palavras tão sinceras. É óbvio que ao exaltarem a democracia verde-amarela, eles estão comparando o momento atual com a ditadura militar. Bem, neste paralelo, não há dúvida de que vivemos num país pra lá de democrático, vivemos num paraíso.

A mídia, que sofreu muito com a ditadura militar, também se derrete toda vez que os brasileiros vão às urnas escolher os “representantes do povo”. E é aí que eu quero chegar.

Jamais viveremos em um país democrático enquanto um cidadão for obrigado a votar.

Se existe uma coisa que não combina com democracia é voto obrigatório. Por que somos obrigados a isso? Por que? Costumo ouvir que é melhor ser obrigado a votar porque, do contrário, sabe-se lá que políticos serão eleitos.

Ora, por favor. Ninguém pode dizer que ficará melhor ou pior. Melhor? No Brasil, não é preciso muita coisa para que o Congresso Nacional, por exemplo, seja melhor. E também não precisa quase nada para que ele seja pior do que já é. Então, por que somos obrigados a comparecer às urnas para votar?

É claro que eu não espero que os políticos avancem no seu modo de pensar em relação a isso. Afinal, eles precisam de pessoas que votem. Do contrário, não serão eleitos. Por isso, a cada período eleitoral, eles exaltam “a força da democracia brasileira“. É uma afirmação em benefício próprio! A democracia não passa pelo voto obrigatório. O país de Barack Obama é o maior exemplo disso.

Se os políticos não avançam nesta questão, pelo menos a mídia deveria fazê-lo. Mas não faz. A mídia também se arvora nos períodos eleitorais, você sabe. No dia da votação, um dos maiores clichês da imprensa brasileira se repete: “Eleitores vão às urnas, na festa da democracia”. E manda matérias da "festa", mostrando jovens de 16 anos e pessoas de idade avançada, que não são obrigadas a votar, nas filas para darem "o exemplo de civismo e amor ao país”.

Também entendo a paixão da mídia por eleição. Das urnas saem políticos. E políticos trabalham em leis. E leis podem – e muito – beneficiar grupos de Comunicação Brasil afora.
Para os políticos e a mídia, a obrigação de votar é um ato democrático. Não é lindo isso? Nada mais livre do que ser obrigado a fazer alguma coisa, não é? Para eles, o povo precisa exercer a sua cidadania votando. Para mim, a cidadania deve ser exercida como eu acho que devo exercê-la. Como sou obrigado a ir à urna, chego à máquina de votar e anulo todas as opções. E saio de lá com a sensação de ter cumprido com o meu dever de cidadão.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Notícia boa é notícia ruim

É interessante perceber que a sociedade, de certa maneira, nunca está satisfeita com o que vê na mídia. Na rotina diária social, não é raro ouvir comentários de pessoas reclamando que os jornais só publicam notícias ruins. "Se torcer, sai sangue", dizem. Que os telejornais só mostram crimes, tragédias, acidentes, corrupção, mortes. Este tipo de comentário encontra eco na realidade, sim. Mas a preferência midiática por assuntos obscuros tem lá os seus motivos.

Não vou, neste espaço, fazer um histórico sobre a imprensa. Mas só para se ter uma idéia do que estou falando, o fotojornalismo, por exemplo, nasceu com a morte. Sim, lá nos primórdios, a sociedade tratou de enviar fotógrafos para os campos de batalha com o intuito de registrar os rostos dos que morriam em combate. Era uma prova de que o bravo soldado havia tombado. E um alívio para as famílias, que, enfim, poderiam promover seus rituais de despedida de seus entes queridos. Aos poucos, no entanto, os responsáveis pela tarefa passaram a se interessar não apenas pelo registro dos mortos, mas também pela atuação dos que ainda estavam vivos. As lentes se voltaram, então, para as cenas de guerra, o ambiente, as dificuldades no front. O texto jornalístico também sempre se ocupou da morte e das tragédias naturais e daquelas provocadas pela instável mente humana.

Uma das razões para tal predileção da imprensa está na própria natureza da sociedade. Se você já presenciou um acidente de carro numa rodovia, sabe do que estou falando. Quando isso ocorre, é comum que o trânsito fique lento nas imediações do local. Os motoristas, em vez de trafegarem normalmente, reduzem a velocidade com um único objetivo: esticar o pescoço para ver o que houve e, principalmente, para conferir se há vítimas em meio às ferragens. Ainda que as pessoas queiram distância da morte, quando ela se dá de forma violenta, passa a ganhar um interesse maior por parte do público.

Então, o que a mídia faz é simplesmente reproduzir fatos que o leitor, o ouvinte, o telespectador ou o internauta está sempre disposto a consumir. A mídia, como diz Edgar Morin, não inventou o crime, a violência, a tragédia. E ainda que muitos jornalistas achem que são deuses, eles também não inventaram a morte.

Por isso, muitas vezes tenho dificuldade para compreender o consumidor midiático. Há poucos dias, o Brasil estava mergulhado no confete, na serpentina, na batucada, no sambódromo, nas mulatas e celebridades nuas, nos desfiles das escolas de samba, nas ruas do Recife abarrotadas de frevo, maracatu e gente. Há poucos dias, o país estava sedado pelo carnaval. O noticiário nacional, embebido pela folia, abriu todos os seus espaços para o pandeiro, a cuíca e o tamborim.

Mas, incrivelmente, no meio da farra, ouvi muita gente dizer que não agüentava mais carnaval, que não suportava mais as notícias das escolas de samba, que já estava cansada de ver aquele monte de gente cantando, pulando, se beijando, se divertindo em plena felicidade. E que a imprensa não tinha mais nada de importante e sério para noticiar. É curioso, no mínimo.

Quando temos uma descontraída sequência de notícias alegres, é porque não somos sérios. Quando o noticiário mostra violência e tristeza, é porque a “mídia só gosta de mostrar tragédia”. Neste cenário sem máscaras e fantasias, cada vez mais vale a máxima jornalística de que notícia boa é notícia ruim.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O ciclo em movimento

Depois de algumas semanas de férias, o corpo parece desobedecer algumas ordens do cérebro. Ainda que também demore um pouco a recuperar o ritmo normal das atividades rotineiras, a cabeça, ao contrário do corpo, não pode se dar ao luxo de atirar-se no primeiro sofá que aparece. Braços, pernas e tronco são chegados num relaxamento, numa preguiça. E conspiram contra a volta à normalidade do pensamento. Mas a cabeça é insistente, persistente. E, mesmo de recesso, funciona sempre.

No meu caso, volto com os neurônios em perfeita ordem, ou seja, agitados como sempre, ocupados como sempre, atarefados como sempre. Alguém pode estar se perguntando se eu, afinal, descansei no verão. A resposta é sim. E muito. Fora do eixo litorâneo das beldades colunáveis gaúchas (trata-se do perímetro que compreende entre Xangri-Lá e Torres, área em que grande parte das mulheres vão para a praia de salto 15 para impressionar), eu me diverti demais.

Muito bem acompanhado pela Me e pelo Filipe*, ocupei o corpo e a mente com muito sol, algumas ondas, muito calor, pizzas, anchovas e tainhas assadas, camarões, pãezinhos de padaria de praia (por que o pão de padaria de praia é melhor que o da cidade onde moramos?) e alguns bons churrascos. Tudo isso regado a muita risada, protetor solar, litros e litros de água e uma moderada cervejinha. Então, seria desonesto se dissesse que não descansei no período de férias. Descansei, sim!

O retorno, no entanto, faz parte das férias. Voltar ao trabalho complementa o ritual de tirar alguns dias de folga. Voltar das férias para lugar nenhum não faz sentido. No meu caso, deixei a areia para trás em troca das minhas turmas de Jornalismo na Unisinos e na PUC. Além disso, começo em março meu doutorado em Comunicação, também na PUC. Por si só, essas três atividades já teriam força suficiente para motivar meu retorno das férias. Dar aula e ser aluno são ocupações gratificantes para mim. Mas o meu trabalho também me traz uma porção de outras coisas boas: traz paz ao espírito, equilibra as minhas relações mais próximas, conduz os aspectos domésticos e, claro, perpetua a inquietude da mente, que já fica pensando nas próximas férias. Só para manter o ciclo em movimento.

* Hoje, dia 25 de fevereiro, Filipe, meu filho, comemora 4.015 dias de vida. Fili, muito obrigado por me fazer feliz há 11 anos.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Férias

Olá, queridos leitores.
Vocês perceberam que o blog não tem sido atualizado nos últimos dias. Por um motivo nobre: férias. Estarei de volta a partir de 18 de fevereiro.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

As ruas da minha infância

Dia desses, enquanto dirigia pela cidade, o Filipe, meu filho, que tem dez anos, me fez uma pergunta difícil de responder.

É bom ser adulto, pai?

Num primeiro momento, disse apenas um “depende”. Como qualquer criança, Filipe não se dá por satisfeito com respostas ridículas como a que eu acabara de lhe dar. E voltou à carga: “É bom ou não é bom ser adulto?” Disse a ele que todas as etapas da vida são boas, que precisamos compreender todas as idades como elas devem ser compreendidas, ou seja, de maneiras diferentes, e destilei outras bobagens periféricas. “É bom ou não é bom ser adulto?” – repetiu o Filipe, já impaciente.

É bom – respondi.
Por quê? – Retrucou meu filho, olhando-me com os olhos castanhos e lindos.
É difícil de responder, filho – me desculpei. E avancei: É bom porque podemos fazer coisas que crianças não podem. Por outro lado, também é bom ser criança. Porque crianças podem fazer coisas que adultos não podem mais fazer.

Em seguida, Filipe começou a ler alguns outdoors ao longo da Avenida Ipiranga, em Porto Alegre. Era a senha de que ele, ao menos aparentemente, havia ficado satisfeito com minha resposta. Mas eu tenho a mania de martelar coisas na minha cabeça. Em geral, assuntos difíceis de encontrar respostas definitivas. Não sei, mas algo no subjetivo me atrai. Então, fiz uma retrospectiva do diálogo que tive com meu filho e voltei ao passado para responder a mim mesmo se é bom ser adulto.

Lembrei da minha infância, em meados da década de 70. E logo de cara já me vi numa encruzilhada: qual a memória mais remota da minha infância? Incrível, mas não lembro de nada antes dos cinco ou seis anos de idade! Será que isso só acontece comigo? Serei eu um cara normal? Será que minha memória está se diluindo de forma precoce?

Depois deste surto existencial, a primeira cena me veio à mente: eu brincando no pátio de casa com meu cachorro, um pastor alemão. Lembrei dos meus amigos mais próximos, como o Raul, o Marcondes, o Batista (com os três ainda mantenho contato eventual), dos jogos de futebol na calçada da Rua Felipe de Oliveira, no Bairro Petrópolis.

Continuo percorrendo os corredores do meu próprio tempo e deparo comigo um pouco maior, cruzando a Rua Eça de Queiroz com uma Caloi linda, de cor clara e pneus altos. Como era bom andar de bicicleta até ouvir o grito de que o jantar estava pronto! Às vezes eu comia no pátio de casa para ter certeza de que meus amigos ainda estariam na rua depois do jantar para continuar nossa brincadeira. Minha casa não tinha grades, apenas um murinho de um metro de altura, se tanto.

As casas não tinham grades e a gente não tinha medo. Eu também adorava uma boa corrida de carrinhos de lomba. Eu e meus amigos chegamos a ‘construir’ um carrinho de lomba que era um ônibus. Ou seja, era um carrão de lomba, com capacidade para cinco corajosos passageiros. Tínhamos problemas para fazer as curvas, é verdade, mas nada que algodão, mercúrio e Band-Aid não resolvessem.

Como era bom aquele tempo! Como eram bons aqueles dias da minha infância... Atualmente, quando faço churrasco aos domingos na casa do meu pai, que fica na Eça de Queiroz, sempre volto um pouco ao passado. E toda vez eu repito em silêncio para mim mesmo: “Essas são as ruas da minha infância”.

Vou falar novamente com o Filipe sobre se é bom ou não ser adulto. Preciso dizer a ele que é muito melhor ser criança. Por um milhão de motivos, mas principalmente porque quando somos adultos, não conseguimos nos lembrar por completo de como foi a nossa infância. Guardamos um passado retalhado, fragmentado, sob neblina.

Só depois de pensar sobre isso é que me dou conta de uma coisa: eu queria ter conseguido guardar todos aqueles dias numa caixa secreta e segura. Queria ter guardado todas as cenas – as boas e as ruins – para mostrar para o meu filho o que eu só descobri quando me tornei adulto: que eu era a pessoa mais feliz do mundo nas minhas ruas infantis. Eu era feliz como deveriam ser os milhares de pequenos seres humanos que hoje vagueiam pelas avenidas das grandes cidades sem comida, sem brinquedo, sem casa, sem amor e sem infância.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

As mulheres, o ciúme e o futebol

Gosto de ir ao supermercado. Quase sempre encontro alguém que não vejo há algum tempo. Dia desses topei com um amigo da faculdade de Jornalismo, o Renato, em um daqueles corredores gelados das comidas prontas. Lembrei da paixão do meu amigo pelo Grêmio e perguntei o quanto ele estava ansioso pelo retorno do time à Libertadores deste ano, onde ele iria assistir aos jogos da equipe e coisa e tal. Renato, que estava sorridente, ficou sério de repente.

Não entendi aquela reação e perguntei o que havia acontecido. Com jeito de conformado, me disse que não iria assistir aos jogos pela televisão. Não assistiria a nenhum jogo este ano. Logo imaginei que ele não tivesse TV a cabo. Mas rapidamente me veio à cabeça a imagem de torcedores assistindo a jogos que só passam pelo cabo nos bares, quando a galera une o útil ao agradável: futebol, cerveja, petiscos e os amigos em volta de uma mesa. Mas ele foi seco, direto. Não iria assistir às partidas porque a mulher dele não queria.

– Como assim? – perguntei.
– Você sabe, as mulheres não gostam de futebol – disse ele. – Elas acreditam que os homens as desprezam quando sentam diante da televisão....

Resolvi trocar de assunto e, em pouco tempo, nos despedimos. Fiquei pensando na dor do meu amigo de faculdade. Pensei como uma mulher pode ser assim, tão perversa. Como ela pode privar meu amigo de assistir a uma partida de futebol na TV que dura, tão somente, noventa minutos? Na volta para casa, enquanto dirigia, refleti sobre o assunto. Por que o futebol incomoda tanto as mulheres? Não todas, claro. Conheço várias que adoram uma partida de futebol. A Me, por exemplo, gosta e entende de futebol. Nos finais de semana, assistimos a jogos na TV e vamos ao Beira-Rio. Volta e meia, em casa ou em qualquer lugar, conversamos sobre o mundo da bola, as contratações do Inter, a situação do Santos, o humor do Muricy e coisa e tal. Aliás, conheço mulheres que jogariam melhor que o gordo do Ronaldo Fenômeno, contratado pelo Corinthians para se tornar, em fim de carreira, a alegria dos zagueiros brasileiros. Mas muitas delas, de fato, não são atraídas pelo futebol. Mais que isso: elas têm ojeriza a futebol....

Depois de muito pensar, percebi que não existe preconceito das mulheres em relação ao futebol, o esporte. Isso não existe. Tanto que em época de Copa do Mundo as minhas colegas de trabalho são as primeiras a organizarem pipocas e salgadinhos para que o pessoal assista aos jogos da Seleção, quando esses ocorrem em horário de expediente por causa do fuso horário e talicoisa. Portanto, as mulheres não odeiam o futebol. O que elas sentem é ciúme.

As mulheres nutrem um ciúme mortal pelo futebol. Talvez porque as mulheres, de uma maneira geral, querem a atenção só para elas. Exclusivamente para elas. As mulheres só admitem dividir o seu amado com os filhos. E olhe lá! Às vezes, nem isso. Dividir o namorado, o marido ou o amante com bichos de estimação, raramente. Com os amigos, uma vez na vida e outra na morte. De preferência, na morte. Mas elas não suportam compartilhar os homens com o futebol. Isso, nunca!

Esse sentimento feminino é ainda mais potencializado quando o vivente tem assinatura de TV a cabo. Sim, porque a TV aberta transmite futebol apenas duas vezes por semana, às quartas-feiras à noite e aos domingos à tarde, para atrapalhar aquela maravilha de programa que é o Domingão do Faustão. Quem tem canais a cabo e gosta de futebol vive no paraíso. É futebol todos os dias e em qualquer horário. Campeonato da Inglaterra, da Alemanha, da França, da Itália, da Espanha, da Ucrânia e da Malásia. Tem os campeonatos estaduais do Brasil, o Paulistão, o Cariocão, o Gauchão, tudo no ÃO. A mulher que vive com alguém que gosta de futebol e tem TV a cabo corre sério risco de pedir divórcio em junho, no meio da temporada, antes de o time do marido perder jogadores na janela de agosto para o milionário futebol árabe.

Alguns especialistas dizem que o ciúme – este sentimento que já destruiu milhões de relacionamentos ao redor do globo – pode ser apenas insegurança. Um medo de perder o amor a que tanto se dedica. As mulheres hão de dizer que se elas não gostam de futebol, os homens empatam esse jogo porque odeiam novelas. Concordo, em parte. Um outro amigo meu só sai de casa à noite depois da novela das 8. Que já é novela das 9 há muito tempo. Mas até onde eu consigo perceber, os homens não exercem esse ciúme abusivo em relação à novela, como as mulheres praticam em relação ao futebol. E olha que a TV aberta deve passar umas 48 novelas por dia durante seis dias por semana...

Não saberia dizer se este pequeno entrave conjugal em que meu amigo de faculdade está metido tem solução imediata. Mas preciso dizer que o futebol e a novela são instituições sociais vivas, que fazem parte do imaginário social enaltecidos pela mídia. O colunista do jornal Zero Hora e meu querido amigo David Coimbra, por exemplo, diz que o futebol é uma representação da sociedade. Pode ser um exagero, mas visto de muitos pontos de vista, representa mesmo. No estádio ou no gramado estão presentes as disputas de poder, as tensões, a vitória e a derrota. A novela também exerce essa representação com histórias que envolvem a ganância, a traição, as paixões, o mocinho e o vilão. Vivemos tudo isso no nosso cotidiano e quase não nos damos conta. A sociedade se vê, diariamente, nas paixões do futebol e nas tramas das novelas. E isso não é bom nem ruim. É apenas uma pequena parte do nosso enredo social.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

O Brasil não muda

O que está ruim sempre pode piorar. O ditado é tão velho quanto sábio. Neste caso, estou me referindo às novas regras da língua portuguesa, o tal Acordo Ortográfico, que entrou em vigor no dia 1º de janeiro deste novo ano. Estabelecido em 1990 para padronizar a escrita em países que falam português (Brasil, Portugal, Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e Timor Leste), agora professores, alunos, colégios, universidades e empresas jornalísticas tratam de se adequar ao novo modo de escrever.

Mesmo que no Brasil as mudanças não cheguem a 1% das palavras utilizadas pelos nativos destes trópicos, não vai ser nada fácil para quem já sabe escrever reaprender os novos caminhos do hífen, por exemplo. Assim, o prefeito recém-eleito está aliviado porque permanecerá como está, mas as meninas que gostam de usar minissaia serão obrigadas a retirar o antiquado hífen e duplicar o “s”. E tem mais.

No caos anual dos aeroportos brasileiros, agora o passageiro não enfrenta apenas atrasos. O acento circunflexo do voo também se perdeu. E não me perguntem de quem foi esta idéia (quero dizer, ideia) de tirar o acento agudo dos ditongos abertos éi e ói das palavras paroxítonas.

Não sou contra mudanças. Elas não me assustam. Mas confesso que não vejo lá muita importância nesta unificação do português. Queremos unificar a escrita de uma língua cuja forma de falar seguirá a mesma em cada um dos países envolvidos. Será que os narradores brasileiros de futebol passarão a chamar a bola de “esférica”, como gritam os locutores de Portugal? Não, eles não farão isso. Por que, então, precisamos escrever como Portugal – e vice-versa – se não vamos falar do mesmo jeito?

Além disso, coisas que deveriam ser modificadas na escrita da nossa língua permanecerão da mesma maneira. O uso da crase é um exemplo disso. Alguém sabe me dizer qual é a utilidade da crase que tanto atormenta estudantes de todos os níveis Brasil afora? E o que dizer dos porquês? Tem o separado com acento, separado sem acento, junto com acento e junto sem acento! Cristo, isso é um preciosismo inexplicável...

Talvez seja por isso que o Brasil me parece, por vezes, um lugar desanimador. É um país que muda pouco quando deveria mudar tudo, como nas verbas astronômicas dedicadas aos nobres gabinetes políticos de Brasília e arredores ou nos altos impostos cobrados de cada um dos brasileiros anualmente. Impostos, aliás, que não voltam à sociedade em serviços públicos qualificados, é bom que se diga. O Brasil muda onde não precisa. E não muda onde é fundamental. Enfim, o Brasil não muda.

** Acesse www.portal3.com.br, site produzido por alunos de Jornalismo da Unisinos, para ler o Guia Prático sobre as mudanças na língua portuguesa.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Dona Tita, uma leitora

Quem vive da escrita depende, fundamentalmente, de leitores. Não há texto sem leitor. Desde 1991, quando comecei a escrever profissionalmente no jornal NH, em Novo Hamburgo, ainda como estudante de Jornalismo, compreendi a importância do leitor. É ele, e ninguém mais, quem escolhe o que quer ler. É uma opção individual, solitária, mas, ao mesmo tempo, definitiva para quem escreve.

Cada vez que coloco um texto para publicação, fico pensando se os leitores irão gostar do que escrevi ou se compreenderão o que quis, de fato, dizer. Nunca tenho a pretensão de achar que o leitor irá concordar com o que escrevo. Depois de lido, o texto não é mais meu. É de quem lê, que faz o que bem entender com o que escrevi. O leitor forma o seu próprio pensamento sobre a minha opinião.

A internet potencializou a força do leitor, que agora não apenas tem ainda mais autonomia para ler o que quer como o faz do jeito que quiser. Mais que isso. A internet proporcionou uma há até pouco tempo inimaginável aproximação entre leitores e escritores ou jornalistas. Há alguns meses, por exemplo, recebi um e-mail de um artista plástico brasileiro que vive na Itália e que, sei lá como, acabou lendo este blog. Eu nunca conversei com este artista. Nunca tinha ouvido falar dele. E talvez ele também nunca tenha ouvido falar de mim. Este é o mistério da internet. Encontramos temas, coisas e pessoas que antes não conseguiríamos não fosse a magia desta rede mundial de comunicação.

Há poucos dias, ganhei uma nova leitora: dona Tita. Ela mora em Taubaté, interior de São Paulo. Fiquei sabendo que ela tem lido os meus textos. Ainda não se animou a escrever comentários sobre o que lê neste espaço. Talvez esteja preocupada com o seu próprio texto, com algum eventual erro de pontuação ou coisas assim. Não se preocupe com isso, dona Tita. Escreva o seu comentário sempre que achar que deva fazer isso. Dê a sua opinião sobre o que a sra. lê aqui. O que importa, para quem escreve, é que, de alguma forma, o texto gere sensações no leitor. É isso o que vale, dona Tita. Obrigado por acessar o blog.