quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Jamaica: mil anos de cultura

A convite da Revista Mundo Jovem, da PUCRS (http://www.mundojovem@pucrs.br/) que aborda, entre outras questões, comportamento, Educação, História e Geografia, escrevi um artigo sobre a Jamaica. Como o texto já foi publicado na edição de fevereiro, reproduzo neste blog o artigo sobre o país de Robert Nesta Marley.

Desde o final da década de 70, ouvir a palavra Jamaica é quase um sinônimo de Bob Marley, de reagge e de rastafari. No entanto, música e religião são apenas alguns dos ingredientes que compõem a rica - mas também sofrida - história da pequena ilha do Mar do Caribe, povoada lá pelo ano 1000. Como praticamente todas as regiões da América Latina, a Jamaica, cujo nome original é Xamayca, que para os nativos significa “terra de madeira e água”, foi alvo de disputas imperialistas, especialmente entre a Espanha (Cristóvão Colombo teria sido o descobridor da ilha em 1494) e a Inglaterra, que a teria conquistado o lugar em 1670. Mas o que os colonizadores queriam, afinal, em uma ilha de dimensões tão pequenas – a Jamaica tem apenas 270 quilômetros de extensão e cerca de 80 quilômetros de largura? Sabemos que o que movia as nações imperialistas – e que até hoje as move – era a exploração das riquezas das terras descobertas. Com a Jamaica não foi diferente. Para se ter uma idéia, durante os dois séculos em que a ilha esteve sob o controle inglês, a Jamaica se tornou o principal exportador de açúcar do planeta. Tudo, é óbvio, a partir do trabalho escravo do povo local.

O processo de independência da Jamaica se deu de forma lenta, mas sempre baseada em sucessivas revoltas dos ilhéus. Segundo os livros de História e Geografia que contam a trajetória do lugar, no começo do século XIX, a população negra chegou a ser 20 vezes superior à de brancos. Ciente de sua força numérica em relação aos imperialistas, os nativos passaram a protagonizar conflitos cada vez mais freqüentes até a abolição da escravatura em 1838. Foi o pontapé inicial para a emancipação, embora apenas pouco mais de um século depois, em 1958, a ilha se tornou província de uma nação independente e, quatro anos mais tarde, finalmente obteve sua total soberania.

Os anos de liberdade não significaram, no entanto, estabilidade econômica. Ao contrário, com o fim da grande produção açucareira e a queda vertiginosa do turismo, na década de 70, a Jamaica livre, de praias lindas e povo sorridente vivia sob índices altíssimos de pobreza, analfabetismo e, claro, violência.

Mas nem as dificuldades socioeconômicas foram capazes de anular as pecuiliaridades da cultura local que, pode-se dizer, é um riquíssimo patchwork etnico e religioso. Compõem a população os negros, os brancos latinos e ingleses. O idioma oficial é o inglês, mas há dezenas de dialetos dessa língua. Na religião, mesclam-se hindus, anglicanos (a maioria) e as tradições nativas que vão do cristianismo aos ritos africanos, como o vodoo. A grande força cultural do país, no entanto, repousa na mistura da religião com a música: o rastafari e o reggae. A religião rastafari (minoria) está baseada na idéia de combater a espiritualidade imposta pela religião européia, ou seja, dos colonizadores.

Com este mosaico de etnias e uma grande diversidade religiosa local, a música passou a ter grande importância na reafirmação da identidade do povo jamaicano. Com o reggae de Robert Nesta Marley, mais conhecido como Bob Marley, se estabeleceu o canal de disseminação não apenas da tradição jamaicana, mas também serviu de voz firme para a crítica ao imperialismo e ao chamamento à união dos povos da África.

Bob Marley morreu nos anos 80 sem ver o seu sonho realizado. A África continua sendo um continente problemático e sua Jamaica vive do turismo e de seu legado musical, mas sem grandes conquistas nas esferas da saúde e da educação. Em suas letras, Marley destaca o sofrimento do povo escravo, a pobreza, a ganância das nações ricas, o amor, a solidariedade, prega a não violência e, claro, exalta a religião rastafari. A música cadenciada de Marley pode ser uma porta de entrada para conhecer um pouco mais sobre a história do país. Mesmo que o sonho de ver uma África unida e uma Jamaica em melhores condições de vida não tenha se realizado como pretendia, é razoável afirmar que ao menos o reggae de Marley conseguiu chamar a atenção do mundo para questões que ele julgava importantes. Mais que isso: o reagge tem contribuído para mostrar a cultura jamaicana ao resto do mundo.

* A foto de Negril, na Jamaica, foi tirada por Roger Bundt em 30 de janeiro de 2008 e gentilmente cedida para este blog.