sexta-feira, 15 de maio de 2009

O tempo

Acordei cedo, pensando na falta de tempo. E me dei conta que marcamos a vida pelo tempo. O tempo primitivo, das cavernas. O tempo da pedra, do fogo. Das guerras sangrentas, das cidades muradas, das cruzadas. Um tempo que parecia não ter fim. O tempo em que os deuses eram muitos. Tempo da inquisição em nome de um único deus. Tempo de buscar um novo mundo, da opressão sob o manto da colonização de povos tropicais e nus. Tempo de escravidão.

Tempo do lampião, da energia elétrica, do trem, da indústria, do capital. Tempo de dominações armadas, da força bélica de algumas nações sobre outras – este tempo nunca passa. Tempo de duas grandes guerras. De pensar uma sociedade socialista, comunista. Tempo do medo permanente de uma guerra fria. Tempo de conhecer o espaço, o universo, a galáxia. Tempo de controlar o incontrolável, a via láctea.

Tempo de crescimento econômico para alguns. De estagnação para outros. Tempo de espalhar ideologias, apagar outras. De tempos em tempos aparece alguém que logo é assassinado. O tempo se encarrega de carregar o morto ao patamar dos mitos. Tempo de trabalho pesado, de jornadas estafantes em busca da sobrevivência rural e urbana. Tempo de perder emprego e de buscar o ganho informal. Tempo de fartura. Tempo de fome. Tempo de crise do social. Tempo de crise do capital.

A mídia conta o tempo que a História só conta muito tempo depois. Tempo da imprensa contar tudo – quando a ela interessa – e de esconder o que pode – quando a ela também interessa. Tempo de literatura, de leitura. O jornal faz o tempo e avisa como será o tempo amanhã. Tempo de tecnologia. Tempo das ondas do rádio. É tempo de televisão.

O fascínio da tecnologia deixa o tempo para trás. Tudo é muito apressado para quem acha que controla o tempo. Tudo é preguiçoso para quem não percebe o que se passa ao seu redor. O tempo de hoje é apenas mais um tempo. Um tempo veloz e repleto de informações. O tempo virtual que nos move pouco se importa sobre o que, de fato, nos comove. O tempo segue firme o seu destino de sempre. Até que nos leve de volta ao tempo primitivo, das cavernas. O tempo da pedra, do fogo. Das guerras sangrentas, das cidades muradas, das cruzadas. Ao tempo que parece não ter fim.

11 comentários:

Pedro Barbosa disse...

Tempo de comentar sobre o tempo. Foi uma bela definição temporal. Nos importamos muito com outras coisas e nem percebemos a importancia que o tempo tem em nossa vida. E o papel que a mídia desempenha neste processo...
Belo texto, como sempre.
Que muito mais historia e literatura venham por aí neste mundo tecnológico...

JMD disse...

Grande Pedro!
O tempo me intriga. Quanto mais tempo eu tenho, menos tempo eu tenho. Quando o tempo passa, temos mais tempo? Ou foi um tempo que se foi? Tempo, tempo, tempo...

Andrei Andrade disse...

Sensacional. Traz a tona a questão: o que podemos chamar de atemporal? Talvez aquilo que tu te referes como "o tempo que nunca passa". E só. O resto é tempo ciclico, vai embora e sempre retorna, como afirmou Nietzsche quando conceituou o "eterno retorno". Do tempo que vivemos, penso que a vida é a "memória do tempo", o que a gente lembra que viveu forma a teia da vida, que se insere no tempo...porra, quanta coisa! Segue o baile...

JMD disse...

É tanta coisa que acho que nem vamos ter tempo!
Abração,
Juan

Andrei Andrade disse...

Bom, mas pensando bem...Que merda seria a vida se tivéssemos todo o tempo!

Abração

Unknown disse...

Nunca temos tempo de pensar no tempo, a correria doa dia dia nos faz pensar que não temos o tempo que esta passando sem darmos conta disso. E quando pensamos que sobrou algum, o tempo já passou e começamos a contá-lo novamente.
Lindo texto prof.
Abraço.
Marta Capitão/FAMECOS-Tmanhã

Unknown disse...

Nunca temos tempo de pensar no tempo, a correria doa dia dia nos faz pensar que não temos o tempo que esta passando sem darmos conta disso. E quando pensamos que sobrou algum, o tempo já passou e começamos a contá-lo novamente.
Lindo texto prof.
Abraço.
Marta Capitão/FAMECOS-Tmanhã

JMD disse...

Marta, que bom receber teu comentário. O blog só vive se tiver comentário dos leitores. Obrigado. Abraço,
Juan

Juliana de Brito disse...

Tempo de ócio. É por esse que espero anciosamente. Enquanto ele não chega, aproveito o tempo de trabalho e, consequentemente, o meu tempo de vida, que espero que seja longo.

Ótimo texto, Juan.
Abraço.

Unknown disse...

como assiiiiiim tu atualizas teu blog e nem pra avisar? ainda mais com um texto desse! e a g-e-n-i-a-l frase quase ali no finalzinho: "O tempo virtual que nos move pouco se importa sobre o que, de fato, nos comove". Muito bom. O tempo é uma incógnita. Há quem diga que parar para pensar nele...é perda de tempo. Porque enquanto pensamos nele, ele passa...
Lindo Lindo o texto. Parabéns!
Beijão

JMD disse...

Maria, querida. Não aviso que tem novo texto no meu blog porque confio que os meus leitores sabem que não escrevo neste espaço toda semana. Tu sabes, não escrevo como quem produz salsichas, uma atrás da outra. Escrevo quando percebo algo no ar, quando uma ficha cai, quando preciso dizer alguma coisa que seja útil. Fecho com o Saramago. "Quando não temos o que dizer, é melhor não dizer nada". Obrigado pela tua implacável e generosa audiência.